Vejo em ti repetida,
A anos de distância,
A minha própria vida,
A minha própria infância.
É tal a semelhança,
É tal a identidade,
Que é só em ti, criança,
Que entendo a eternidade.
Todo o meu ser se exala,
Se reproduz no teu:
É minha a tua fala,
Quem vive em ti, sou eu.
Sorris como eu sorria,
Cismas do meu cismar,
O teu olhar copia,
Espelha o meu olhar.
És como a emanação,
Como o prolongamento,
Quer do meu coração,
Quer do meu pensamento.
Encarnas de tal modo
Minha alma fugitiva,
Que eu não morri de todo
Enquanto sejas viva!
Por que mistério imenso
Se fez a transmissão
De quanto sinto e penso
Para esse coração?
Foi como se eu andasse
Noutra alma a semear
Meu peito, minha face,
Meu riso, meu olhar...
Meus íntimos desejos,
Meus sonhos mais doirados,
Florindo com meus beijos
Os campos semeados.
Bendita é a colheita,
Deus confiou em nós...
Colhi-te, flor perfeita,
Eco da minha voz!
Foi o amor, foi o amor,
Ó filha idolatrada,
O sopro criador
Que te tirou do nada!
Deus bendito e louvado,
Ó filha estremecida,
Por te cá ter mandado
A reviver-me a vida!
Alberto de Oliveira, in "Lar"
2 comentários:
Qual é o pai/mãe que não se revê (pelo menos nalgumas características) nos seus filhos?
Lindo poema!
Tem razão...
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